A devoção a São Gonçalo, era proveniente aos costumes dos grandes comerciantes, o que era o caso de Gonçalo Gonçalves, sesmeiro que mais brilhou entre os demais para a fundação da cidade de São Gonçalo, demarcando o espaço em que vive hoje os gonçalenses.
Seu padroeiro, São Gonçalo, e detentor de várias vertentes históricas diferentes. É o que veremos neste artigo, que relatará as várias formas de pensar o Santo milagroso.
O Santo violeiro? Será? Mas uma coisa eu posso dizer, que o mesmo nasceu em 1187 (século XII), em Arriconha, no Conselho de Guimarães, Portugal. Ordenou-se sacerdote, pertenceu a ordem de São Domingos e dedicou-se à pregação doutrinária, comprovando-a com a realização de milagres. Sua morte foi datada em 1260 (século XIII), após ter-se fixado em Amarante como eremita, onde tentava converter os bêbados e as prostitutas a não permanecerem com estas práticas, e desta forma, sempre acompanhando os menos favorecidos.
A ele á atribuída a construção ou restauração da ponte de Amarante. Foi beatificado em 1565, porém não canonizado, é considerado o Santo das velhas solteiras, ou seja, o casamenteiro dos idosos, o Santo da fertilidade, pois em meio ao impedimento a gravidez, as mulheres levantavam suas saias e se esfregavam no Santo para poderem engravidar; Santo dos negros aquilombados, pois era comemorado com batucadas o seu dia, e isto, perpetua perante o tempo, e é o que acontece no Quilombo de Kalunga, no Nordeste de Goiás, onde São Gonçalo faz parte da dança do Imperador, e visto em nossos dias atuais a mesma prática do passado; o Santo protetor das construções, principalmente para os construtores de pontes, ou seja, engenheiros.
Na verdade, o "Santo do atabaque" é o mesmo que o do altar da igreja Matriz de São Gonçalo, e o mesmo do Imperador no culto no referido Quilombo, no interior do Brasil.
A dança de São Gonçalo atrai atenção de vários folcloristas que descrevem as diversas maneiras de desempenha-la, encontradas em localidades brasileiras.
Trata-se de antiga dança religiosa, que tem lugar diante de um altar. Ela nos veio de Portugal, talvez mesmo com os primeiros colonizadores, pois o culto a São Gonçalo ali já era realizado por vários anos. D. João III, por exemplo, foi fervoroso devoto do Santo, que era cultuado com danças e cantigas pedindo casamento na frente do altar. Parece que, desde o início, consistiu o culto especialmente em danças, pois os Cônegos da Sé do Porto dançavam diante do altar de São Gonçalo, no dia da festa, certa dança hierática e devota, que hoje se perdeu.
A primeira referência à dança no Brasil é feita por Gentil de La Barbinais, que a ela assistiu em janeiro de 1718 na cidade de Salvador, ficando impressionado com o caráter de “saturnal cristã celebrada ao som mavioso das violas”. Realizavam-se então habitualmente dentro das igrejas, tento sido proibida sua execução nelas no decorrer do séc. XIX, sabendo-se com precisão que em Olinda e Recife tal proibição se deu em 1817. É encontrada ainda hoje pelo interior brasileiro, ao que se sabe no Rio Grande do Norte, Minas Gerais, Bahia, Goiás, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio de Janeiro, constituindo “talvez a derradeira dança como ação religiosa, oferenda litúrgica, que possuímos”.
Demorando algum tempo no município de Jeremoabo, no Estado da Bahia, é vista à realização da dança de São Gonçalo no povoado de Santa Brígida. Vivem neste povoado, lado a lado, levando aparentemente o mesmo tipo de existência material e moral, um grupo de baianos autóctones e um outro grupo que há 10 anos para cá ali se foi reunindo, formando principalmente de alagoanos emigrados do seu Estado natal. Ambos dançam o São Gonçalo. Mas enquanto a dança está florescente no meio alagoano, no meio baiano ela quase não se realiza mais.
A Dança de São Gonçalo faz parte do conjunto da cultura rústica brasileira.
Pelas funções que desempenha, é cerimônia religiosa coletiva, na qual o aspecto lúdico é secundário.
A religiosidade, caráter primordial da dança, fica patente quando é estudada em suas funções explícitas e implícitas.
A Dança de São Gonçalo, perfeitamente integrada na cultura brasileira, mostra que faz parte do conjunto desta e permite levantar a hipótese de que seu aspecto predominantemente religioso é traço antigo, como antiga é a cultura rústica de que a dança faz parte.
O elemento pode sofrer modificações sem que se transforme seu caráter primordial. No caso da dança, era o de ser religiosa. Tanto no meio alagoano quanto no baiano, mau grado as mudanças havidas, este traço permaneceu constante.
A perfeita integração da Dança de São Gonçalo no meio alagoano e sua decadência no meio baiano indicam a possibilidade de um estudo da preservação e do desaparecimento de elementos folclóricos em tipos sucessivos de cultura, com o fim de pesquisar e que nexos sociais se ligam tais mudanças.
A Dança de São Gonçalo tem por base a solidariedade vicinal; onde esta decai, a dança tende a perecer.
Em organizações sociais semelhantes, as adaptações de elemento folclórico tomarão um aspecto semelhante, seguirão uma via semelhante. É o que nos indica a comparação entre as funções do São Gonçalo alagoano e as do paulista descrito por Marciano dos Santos.
Não deixemos que o Santo da cidade de São Gonçalo siga os mesmos moldes do que tem acontecido no Brasil como um todo, isto pela pouca, ou quase nenhuma valorização do patrimônio histórico e cultural, que não significa nada para alguns que detêm o que a cultura precisa, mas não o faz.
Marcos Vinícius Macedo Varella
Pesquisador e Historiador